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ISBN: 978-65-87289-23-6
GT02: Antropoéticas: outras (etno)grafias

Patrícia Pinheiro, Alexsânder Nakaóka

Formas de expressão e materiais sensíveis, gráficos e audiovisuais têm constituído parte significativa dos processos de pesquisa antropológica, presentes não somente pelo que "mostram" de modo objetivo, mas também pelas texturas, autorias, sensações e pela receptividade ao caráter experimental do pensamento. Entre recursos diversos, como desenhos, montagens, fotografias e filmes/vídeos, propomos acolher discussões sobre sensibilidades e sensorialidades no fazer etnográfico-antropológico, assim como contribuições analíticas sobre a construção do conhecimento científico a partir da produção de materiais sensíveis diversos, de modo colaborativo entre interlocutoras/es e o meio acadêmico. Sendo assim, a proposta deste GT é reunir pesquisadoras/es que promovam em seus trabalhos a relação entre poética e Antropologia, de modo a estimular discussões sobre as múltiplas potencialidades narrativas acionadas nos atos de observar, registrar, descrever, criar, imaginar e compartilhar, permeadas por sentidos e sensibilidades. Se dão em meio a campos de forças, relações de poder e conflitos, que dizem respeito tanto à própria constituição da Antropologia Audiovisual e da Imagem, quanto aos inumeráveis temas e campos de pesquisa nos quais podemos atuar. O GT dá continuidade a eventos anteriores - como o 18º Congresso da IUAES, a 31ª e 32ª RBAs e a XIII RAM, que por sua vez contribuíram para a formação do GT homônimo na Associação Latino-Americana de Antropologia Social (ALA).

Palavras chave: Poéticas; etnografia; audiovisual
Resumos submetidos
A agência social das fotografias
Autoria: Vanessa Lopes da Silva
Autoria: Esta pesquisa iniciou vinculada ao Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica, no projeto intitulado de "Etnografias e Comparações: Regimes das Artes, Memórias e Imagens" na Universidade Federal do Ceará, na qual pesquiso a "fotografia" como objeto de estudo no âmbito da antropologia. Primeiramente, a minha reflexão é despertada ao observar que estamos inseridos em uma sociedade repleta de fotografias, algumas são efêmeras, outras permanentes. Ademais, partindo do pressuposto que as fotografias são um reflexo das relações sociais, investigo a "agência social" mediada pelas fotos reveladas, tendo como o principal objeto de pesquisa uma foto que registrei em 2014. Portanto, o referencial teórico basilar desta pesquisa é a antropologia da arte proposta por Alfred Gell, tensionada por outras abordagens que contribuem para pensar a fotografia. Além disso, o trabalho ampliou-se para pesquisar outros desmembramentos de vida das fotos, investigando-a como artefato, seja pelas trocas de retratos ou quando proponho pensá-la como "agente paciente" que sofre intervenções sociais. Para tanto, o trabalho se vale das discussões em torno da "noção de pessoa" na antropologia, de modo a operacionalizar a ideia de agência nas fotografias. Portanto, as conclusões parciais desta pesquisa em desenvolvimento é que as fotos medeiam relações em diversos contextos sociais, desse modo, se relaciona com questões fundamentais que tange a análise antropológica.
Aprender na Prática: experiência com afeto e educação no contexto das autorrepresentações fotográficas de mulheres em Maceió/AL
Autoria: Tayná Almeida de Paula
Autoria: No estudo antropológico desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Alagoas (PPGAS/UFAL) trato da experiência de pesquisa com as autorrepresentações fotográficas de mulheres na cena contemporânea em Maceió/AL. Movida pelo reconhecimento das assimetrias de gênero no campo artístico da fotografia, categoria da qual também faço parte, tenho por objetivo compreender como as autorrepresentações visuais criadas por fotógrafas mulheres produzem fraturas no regime ocidental de representação dominante, caracterizado por tradicionalmente subjugar a imagética das mulheres. Para tanto, baseada na "educação da atenção" observada por Tim Ingold (2010) e no processo em "ser afetada" pela experiência de campo, nos termos de Favret-Saada (2005), busco evidenciar nesta exposição a possibilidade metodológica de aprender na prática com as parceiras de pesquisa, através de meu engajamento criativo em espaços de aprendizagem orientados por elas. Nesse sentido, considerando o contexto de enfrentamento à pandemia da Covid-19 em que a pesquisa emergiu e, consequentemente, a impossibilidade de presença física em campo, devido ao isolamento seguido de distanciamento social, apresento uma possibilidade de pesquisa no período epidemiológico, em particular, e em períodos de desterritorialização de campo, em geral. Mas sobretudo, apresento uma produção de conhecimento antropológico pela etnografia visual na qual a base epistemológica de distinção entre eu e outra/o, sujeito e objeto, arte e ciência pode ser repensada, suscitando questões éticas, metodológicas e políticas.
Por uma Antropologia da Montagem: narrativas e grafias nikkeis
Autoria: Alexsânder Nakaóka
Autoria: Este trabalho parte da pesquisa de pós-doutorado que atualmente realizo junto ao Núcleo de Antropologia Visual (NAVISUAL) da UFRGS, e busca evidenciar como a relação entre distintas formas de narrativas e grafias é capaz de potencializar a confecção do saber antropológico, tensionando a prática e a escrita etnográfica por meio da montagem. Para tanto, tenho realizado trabalhos de campo multissituados (Marcus, 1995) com interlocutoras/es nikkeis na minha região de origem, Vale do Aço-MG, e no Rio Grande do Sul, em especial na maior colônia japonesa do estado, localizada na zona rural da cidade de Ivoti. Tais interlocuções levarão em conta a existência de um estilo de vida ou ethos (Bateson, 1936; Mead e Bateson, 1942) dos japoneses e seus descendentes no Brasil. Como se dá o conjunto de vivências partilhadas entre o antropólogo e os grupos/indivíduos com quem ele estuda? A partir do estabelecimento das imbricações possíveis entre diversas formas de expressão (verbais e imagéticas-gráficas), quais formas de conhecimento são geradas? A questão central, portanto, será investigar como relacionar as complexas experiências intersubjetivas estabelecidas em campo, a partir da coleta e da produção de grafias e narrativas, para compor e experimentar o saber antropológico. Dessa forma, pretendo revelar a existência desse ethos alicerçado nas imbricações entre a verbalidade e a visualidade, duas formas de conhecimento ontologicamente distintas: a primeira corresponde a uma forma de narrar. Já a segunda, a uma forma de fazer narrar. Logo, o procedimento epistemológico da montagem se fará duplamente potente: primeiro, porque tomá-la como um modo de pensamento sui generis é instigante para relacionar elementos heterogêneos dentro da "antropografia" (Ingold, 2015). Além disso, pois buscarei estabelecer um conhecimento por e com imagens, que será obtido a partir de experimentações visuais/gráficas.
Conhecendo a Antropologia pelo desenho: experimentações pedagógicas e metodológicas
Autoria: Katianne de Sousa Almeida
Autoria: Este trabalho compartilha abordagens preliminares da pesquisa de doutorado sobre o uso do desenho como artifício pedagógico para a formação antropológica dentro da estrutura disciplinar acadêmica em Universidades brasileiras, especificamente inserido nos cursos de Antropologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e na Universidade Federal de Goiás (UFG), quanto em um curso de extensão (Desenho etnográfico), este em parceria da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) com a UFRJ. O objetivo é divulgar estratégias de ensino de Antropologia utilizando o desenho para se compreender de forma prática as diversidades, as sutilezas e as temporalidades existentes no trabalho de campo antropológico. Foi importante identificar nas aulas e atividades do curso de extensão a relação histórica, em que desde a concepção da Antropologia como campo do conhecimento, do uso do desenho como ferramenta de pesquisa e auxílio à compreensão das expressões culturais de grupos sociais registradas nos diários de campo, aos dias atuais em que o desenho saiu do diário e assumiu um lugar de destaque na produção de ideias e síntese de conceitos. A Antropologia feita com desenhos coloca em diálogo linguagens e metodologias diversas, o que pode provocar uma produção de conhecimento científico mais dinâmico e acessível, consequentemente, a ampliação dos horizontes epistêmicos da disciplina, assumindo os riscos da experimentação no desenvolvimento da Antropologia na contemporaneidade. As produções das alunas, alunos, alunes e cursistas dentro das disciplinas e no curso de extensão evidenciaram o engajamento das(dos) pesquisadoras(es) em evocar a linguagem do desenho em suas investigações ou observações, buscando ampliar o debate acerca das diversas possibilidades de comunicar seus trabalhos para além das palavras. O diálogo proposto entre desenho e Antropologia vem portanto, construindo importantes fundamentos teóricos e imagéticos para potencializar a elaboração do pensamento antropológico não apenas como ferramenta de pesquisa, mas um método capaz de mostrar outros caminhos para as etnografias.
Vivências sensoriais e a produção de sentidos a partir do som: Primeiros episódios
Autoria: Daniele Borges, Pedro Henrique Guatura Darlan
Autoria: Neste trabalho discutiremos, a partir de nossas primeiras experimentações, enquanto editores do Podcast Caraminholas, algumas ideias acerca da produção de sentidos relacionada à sonoplastia neste contexto narrativo em que se privilegia o som como meio de comunicação. Inicialmente pensado como dispositivo de restituição em processo, o podcast tornou-se, já em sua fase inicial, parte importante do campo de pesquisa, configurando-se como um meio privilegiado de interlocução, que ocorre sobretudo nos bastidores da produção, envolvendo pesquisadores, profissionais da saúde e clientes da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Além de ser um espaço para ventilar a produção antropológica além da academia (FLEISCHER, MANICA, 2021), está ética e politicamente engajado ao Movimento da Reforma Psiquiátrica. Logo, os debates refletem (e refratam) sobre a descolonização (FANON,1968; MEMMI, 2021) da Saúde Mental (SM), o fortalecimento das novas abordagens em SM, a valorização e a transmissão das vivências, a defesa dos direitos, a dignidade e a autonomia de quem busca outras explicações — que não apenas a biomédica — para os acontecimentos em sua vida. Sinteticamente o Caraminholas valoriza os diversos significados dados por cada pessoa às suas experiências com os sentidos. Ao deslocar as vivências sensoriais do seu contexto significativo tradicional, sintomático e negativo, para pensá-las enquanto variações da experiência humana, parece fundamental pensarmos o tipo de experiência sonora que cada episódio oferece. Pois, os estímulos auditivos, sejam eles ruídos ou melodias, despertam sensações arquivadas em nossa memória que, ao serem evocadas, criam uma ambiência emocional imersiva que atua sobre os sentidos transmitidos. E isso será determinante para o tipo de narrativa que estamos construindo e sobre o modo como alcançaremos o público. Assim, além de não estereotipar a narrativa é necessário que ela faça sentido tanto para quem vive as experiências narradas, quanto para quem não está familiarizado com o tema. Os aspectos relacionados à sonoplastia, portanto, não são menos importantes que as informações comunicadas ao longo do episódio, mas somam-se a elas. Pois, é a partir da construção de uma ambiência sonora (VEDANA, 2018; INGOLD, 2015), que vai sendo modelada na edição, que convidamos os ouvintes a imergir no ambiente que conecta as nossas subjetividades às suas, fazendo interagir informação, percepção e imaginação. As imagens mentais criadas a partir do som, sugerem percursos imaginativos que produzem sentidos e quando pensamos na articulação entre as dimensões ética, poética e política do fazer antropológico precisamos problematizar toda produção de sentido e suas possíveis reverberações, sobretudo em se tratando de narrativas com potência dialógica.
O Eu e o Outro em Campo: experiências metodológicas
Autoria: Giovanna Olinda dos Santos Bernardino
Autoria: Um dos meus pânicos acadêmicos sempre foi fazer entrevistas. Esteve incrustado na minha cabeça que, para realizar um bom trabalho de campo, eu precisava ter: um roteiro definido, com perguntas suficientemente interessantes, a ponto de serem a chave para abrir um tesouro que meu interlocutor guardava; áudios gravados em ambientes silenciosos e calmos; e um tempo de permanência muito grande junto aos interlocutores com quem eu desenvolveria a pesquisa. Entretanto, na travessia acadêmica, o real aconteceu e ruiu a maioria dessas construções. Minha temática de pesquisa, desde a Iniciação Científica em 2015, trata daqueles que fazem da rua sua morada e, já de início, levei alguns tombos por tentar encaixar os meus ideais metodológicos nesse universo rotineiramente caótico (no sentido dado por José Saramago: ordem por decifrar). A rua me ensinou, não sem eu teimar, que existem tempos diferentes e que a quantidade dessa temporalidade não está associada à qualidade dos encontros. Os pensamentos metodológicos pré-estabelecidos me faziam temer a pesquisa de campo. Porém, ao sair do cinema, andando pela cidade, indo para o trabalho, voltando da faculdade, descendo para pegar comida, encontrando amigos ou indo ao mercado: "meu campo" se mostrava pra mim e eu interagia com ele nos termos da vida. Ou seja, não como pesquisadora, mas como pessoa encontrando outra pessoa. Depois dessas interações, muitas reflexões surgiam e eu escrevia sobre elas para que ficassem registradas não apenas em minha memória. Assim, minha constância no campo começou a ser mensurada pela minha vida inteira e não apenas no momento em que eu vestia a máscara de pesquisadora e saia em busca de algo ou alguém. O movimento metodológico se fez em vias distintas daquelas que eu considerava corretas: deixei a vida acontecer, o campo se mostrar, me permitir viver as experiências, sem me preocupar com nada mais além daquela conversa, e - depois disso - retornei à minha versão acadêmica e utilizei as construções teóricas para dialogar com o vivido. Certamente esse caminho não chega aos mesmos resultados daqueles em que as entrevistas são pré-estruturadas e gravadas, porém, percebi o potencial acadêmico diferencial desses encontros, que são feitos mais de sensibilidade do que racionalidade. E foi justamente com uma ferramenta artística que consegui fomentar cada vez mais essas experiências. Com a fotografia, o campo se ilumina entre as sombras e seu registro se faz pela imagem. A câmera pode assustar alguns ou pode ser uma ponte para uma rica interação. Troquei as vestes acadêmicas pelas roupagens ligadas à arte, e percebi que, por esses caminhos do sensível, existe a diminuição das distâncias construídas entre semelhantes, possibilitando real experiência, que se faz a base do "meu campo".
Claude Lévi-Strauss: cidades, viagens e imaginações
Autoria: Jeferson Carvalho da Silva
Autoria: Muitas são as cidades descritas e relatadas pelo antropólogo Claude Lévi-Strauss ao longo de suas viagens e trajetória, no Brasil e em outras partes do mundo. Para citar algumas, temos São Paulo, Rio de Janeiro, Cuiabá, Londrina, Nova York, Tóquio, Paris, Fort-de-France, Calcutá, Lahore. Tomando como laboratório suas descrições e relatos sobre cidades, feitos em textos e imagens, este trabalho tem como objetivo especular formas pelas quais a antropologia pode ser capaz de contribuir e criar imaginações acerca dos modos de construção e habitação de nossas cidades contemporâneas, atentando para os desafios e questões suscitados pelo Antropoceno. Trabalhar com esse material é uma forma de adentrar cidades outras, aproximando-se de cidades imaginárias, tal como as "cidades invisíveis" de Italo Calvino, experimentando ficções durante esse processo. Nesse sentido, questiona-se: como é possível caminhar pelas cidades descritas e imaginadas por Lévi-Strauss ao longo de suas obras e trajetória? Como essas descrições podem inspirar e contribuir com a forma com que a antropologia trabalha e se relaciona com o fenômeno das cidades? De que maneira a descrição dessas cidades, feitas por Lévi-Strauss em textos e imagens, deixam ver a construção do olhar do antropólogo com relação aos espaços urbanos? Longe de querer responder essas perguntas, o que pretendo é seguir em suas confluências, colocando as cidades em questão. Assim, por esse caminho, apresento experiências onde modos de conhecimento se conversam e as imaginações se tornam valores heurísticos aos fazeres antropológicos, trilhando na composição de proposições onde a realidade é colocada em tensão, bem como as próprias categorias metodológicas da disciplina. Com isso em mente, busco entender como as cidades de Claude Lévi-Strauss nos permitem (re)pensar e (re)imaginar as nossas próprias cidades e as formas como as percebemos.
Poemas Dançandos: o diálogo entre dança, poesia e tecnologia na preparação do espetáculo na Gaya Dança Contemporânea.
Autoria: Marília Melo
Autoria: Este trabalho visa dialogar dança, técnica e emoções, através de uma etnografia do processo de criação do espetáculo na Gaya Dança Contemporânea/UFRN, que atua na cidade de Natal/RN. Opto por focar no desenvolvimento dos trabalhos coreográficos que abordam questões existenciais (angústia, solidão, medo, alegria, relação entre vivos) e sensoriais (por parte dos sentidos: visão, tato, olfato e audição). Colocando ênfase, nesse momento, nos trabalhos coreográficos apresentados durante a pandemia da COVID-19, dialogando a dimensão estética que basea a produção da dança contemporânea, com as propostas técnicas para a vídeodança e a coreoedição, presentes nos recortes cênicos de Corpo Isolado, Para quando o verão chegar e Poemas Dançados II e III, apresentados através da plataforma do Youtube, nos canais de 72ª SBPC Cultural e Gaya Dança Contemporânea. Enriquecido também por uma prática pessoal de dança, esta pesquisa nasce de uma antropologia interpretativa e colaborativa. A proximidade com o grupo, através da prática de pesquisa, transformou a pesquisadora em intérprete-criadora na Gaya Dança Contemporânea, compartilhando as alegrias e as tristezas dos corpos afetados pelo período instaurado pela pandemia em 2020 e também na criação coreográfica em período de isolamento social. Como o próprio nome sugere, Corpo Isolado mexe com as emoções e imaginários a respeito das sensações do corpo obrigado a isolar-se socialmente. Para quando o verão chegar e Poemas dançados II e III, narram as descobertas do próprio "eu", frente as tantas reflexões trazidas pelo momento, sob a narração de poesias de Clarice Lispector, na voz, no olhar e nos gestos dos intérpretes-criadores da Gaya Dança Contemporânea. Nesse contexto de grupo, apresento os corpos que criam, improvisam, sentem e refletem questões sociais que habitam nos gestos da dança em preparação da série de vídeodança "Poemas Dançados". A bibliografia perpassa antropologia da dança, do visual e da emoções, traçando também uma relação entre a antropóloga-bailarina e suas afetações como intérprete-criadora. PALAVRAS-CHAVE: Antropologia; Dança; Poesia; Tecnologia; Covid-19.
"El candombe no se escribe en un papel": dilemas da escrita etnográfica e da gravação sonora na prática musical do candombe afro-uruguaio
Autoria: Lisandro Lucas de Lima Moura
Autoria: O trabalho propõe uma discussão a respeito da escrita etnográfica e da gravação sonora no contexto das "llamadas" de candombe, evento musical coletivo próprio das comunidades negras do Uruguai. As "llamadas" são realizadas no ambiente da rua, por meio de desfiles e cortejos, e a execução musical é protagonizada pelos tambores afro-uruguaios, denominados "chico", "piano" e "repique". A manifestação musical e cultural do candombe requer, de nossa parte, uma atenção especial às interações que ocorrem entre os sons dos tambores, o ambiente acústico das ruas e avenidas e as sensações do público participante. Estamos falando de fenômenos sonoros e vibracionais que ocorrem por meio de junções públicas e de experiências participativas pulsantes e dançantes que tomam a forma de uma "ondulação energética" (Ferreira, 1999). Tudo isso é descrito por tamborileros e candomberos como um fenômeno que flui e que "no se escribe en un papel", porque "es un sentimiento". A execução polirrítmica dos tambores resulta, pois, em estados emocionais coletivos ("la magia del candombe") difíceis de transcrever racionalmente por meio da linguagem acadêmica. Essa ideia indica, pois, os limites da escrita etnográfica e das formas de comunicar ao público leitor as sensações vividas em trabalho de campo. Desse modo, como desdobramento de pesquisa de doutorado, e em diálogo com as proposições recentes de Ferreira (2021) sobre o assunto, o presente trabalho discute se a gravação sonora e a escuta posterior desses registros podem ser um caminho metodológico no sentido de permitir o acesso às práticas e conhecimentos próprios do universo musical candombero.
"O Corpo Dela é Uma Ocupação": artivismos e mulheridades
Autoria: Luciana Ribeiro
Autoria: Eu tenho uma amiga Dj. Até aí, nada de novo, além do meu privilégio de circular pelas festas virtuais que se multiplicaram rapidamente durante o isolamento social deflagrado pela pandemia da Covid19 em março de 2020. Ela é uma Dj feminista. E, foi com ela e com outras amigas artistas cantoras, compositoras e performers que pude perceber mais atentamente tanto as letras, melodias e batidas presentes em algumas das músicas que escutava. Nas festas virtuais que fui (e ainda vou), procuro estar atenta ao que escuto e de como as mulheres presentes se comportam quando as melodias, consideradas por mim como feministas, são tocadas. De início, havia apenas um interesse despretensioso em escutar as músicas e observar o que dali emergia em meio aos sons, imagens e pessoas (na maioria desconhecidas) que surgiam nas janelinhas do Zoom, plataforma usada para festas virtuais diante de sua maior aplicabilidade no uso de imagem e som. Aos poucos, fui conhecendo e reconhecendo uma série de artistas que tratavam de formas diferentes o debate feminista e transfeminista contemporâneo, com destaque para o contexto de corpas, identidades e sexualidades dissidentes. Experimentações que ajudaram na construção de um projeto de pesquisa para um pós-doc, ainda em fase embrionária. O texto que proponho trazer para este GT advém de uma dessas experimentações. Trata-se de um bate papo sobre música e feminismo na Rádio Cafuné (@radiocafune), em um programa que as mulheres da rádio estavam começando a construir: a "Cafunelas". Minha participação incluía conversar sobre música e feminismo e, entre um bate papo e outro, tocar algumas músicas de uma setlist montada por mim. Dessa forma, este texto tem a intenção não só de contar como foi esse bate papo feminista musical na Cafunelas, mas também, de como surgiu meu interesse sobre músicas, feminismos, mulheridades e corpas dissidentes a partir de algumas das melodias produzidas no Brasil nos últimos dez anos (de 2010 até 2020) por mulheres e/ou outras pessoas da comunidade LGBTQIA+ que, de alguma forma me chamaram atenção por abordarem tais questões. Assim, este texto tem um recorte pessoal, destacando o que encontrei de mais expressivo em minhas buscas como consumidora a partir de minhas pesquisas nos apps: Spotify, Youtube e Instagram. Para isso, uso, como base de observação e análise, autoras contemporâneas que trabalham com questões ligadas a feminismo, feminismo negro, transfeminismo, arte e artivismo, tais como: Heloisa Buarque de Hollanda (2018), Silvia Federici (2017), Djamila Ribeiro (2018); Jaqueline Gomes de Jesus (2014), Maria Cristina do Nascimento (2014) e Duda Kuhnert (2018). A proposta agora é apresentar tal experimento e, na sequência, expandir a pesquisa para além das festas virtuais. E segue o baile!