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ISBN: 978-65-87289-23-6
GT15: Antropologia dos Povos Tradicionais Costeiros: Práticas Sociais, Disputas Identitárias e Conflitos

José Colaço, Francisca Miller

Como é de conhecimento na literatura antropológica, diversos grupos sociais que vivem do extrativismo e da agricultura, entre outras atividades - tais como pescadores artesanais e ribeirinhos em geral - foram ou são habitantes de regiões costeiras e historicamente têm sido impactados por diversos fenômenos. A expansão metropolitana, os desastres ambientais de grandes proporções, o turismo em pequena e larga escala, as formas de controle oficial em áreas de interesse ecológico, são alguns processos que vem reconfigurando o uso e a ocupação de territórios costeiros e ribeirinhos no Brasil. Este Grupo de Trabalho tem reunido, de modo bem sucedido, nos últimos anos, pesquisas empíricas e de caráter etnográfico que colocam em evidência tensões, disputas e conflitos entre os povos e comunidades tradicionais e os vários modelos de uso e ocupação de territórios ribeirinhos e costeiros. Reflexões sobre o manejo de ecossistemas, as formas de organização política destes grupos, suas estruturas econômicas, bem como os conflitos suscitados por diferentes processos e agentes sociais - sobretudo agências estatais, organizações não governamentais e empresas - são alguns dos aspectos que serão discutidos nesta atividade.

Palavras chave: Povos Tradicionais; Regiões Costeiras e Ribeirinhas; Conflitos
Resumos submetidos
"Eu gosto daqui": ontologia e escolhas de uma comunidade amazônica na relação entre humanos e natureza
Autoria: Uriens Maximiliano Ravena Cañete, Voyner Ravena Cañete, SONIA MAGALHÃES
Autoria: Este trabalho parte da perspectiva de que sociedades alternativas, neste caso uma comunidade costeira na periferia do sistema hegemônico, especificamente na RESEX Mocapajuba, município de São Caetano de Odivelas, costa paraense, constrói seu conhecimento a partir do afeto, particularmente entretecido na relação com a natureza e escolhe permanecer desenvolvendo seu modo de vida particular, distanciando-se da sociedade maior. A pesquisa fez uso de uma etnografia marcada pela condição de ser afetado, portanto, decorrente das próprias trajetórias pessoais do etnógrafo. Ela apresenta um teste teórico que, por meio da alteridade e de conceitos decoloniais, intenta compreender quais são os motivos que levam os moradores da comunidade de Monte Alegre da Barreta, a fazer escolhas que os conduzem a um modo de vida que se diferencia e se opõe à sociedade hegemônica. As reflexões aqui apresentadas alicerçam-se na presença das categorias êmicas percebidas e debatidas a partir dos dados etnográficos, cotejando-os com leituras que discutem a decolonialidade do conhecimento. Duas categorias êmicas - gastura e sossego - emergem e evidenciam uma particular relação entre os moradores (humanos) e a natureza envolvente, a qual os moradores tanto apreciam e se conectam para além da necessidade de satisfação de suas necessidades de sobrevivência humana.
Trilhas da vida pesqueira e a rua da cruz: conversas entre pescadores e escolas.
Autoria: Verônica Gomes de Aquino
Autoria: No ano de 2020, optei por ampliar a pesquisa, "Quando a ficção atravessa vidas pesqueiras", desenvolvida na Escola Ver. João da Silva Bezerra, localizada na Barra de Maricá. Práticas desenvolvidas por alunos, professores, profissionais e as famílias pertencentes à Barra de Maricá. Após muitas conversas, dentro e fora da escola, fui tecendo novos fios metodológicos, que me levaram a descoberta da população tradicional deste litoral, ou seja, ao encontro das famílias que vivem da pesca por muitas décadas. Ao mesmo tempo que elaborava o mapeamento das famílias, conhecia os contextos de muitos saberes. Famílias, que durante muitos anos, lutam por seus direitos sociais. Pude ainda, saber através das narrativas dos diferentes sujeitos, a ficção produzida no ano de 1974, "Fogo sobre Terra", novela que produziu transformações sociais na comunidade. Objetivando estudar as comunidades pesqueiras dos bairros além, da Barra de Maricá, amplio para Zacarias e Guaratiba. Analisando fotografias que fiz nos anos de 2018 e 2019, capturei a ideia que intitulei como: "Quando a gente das areias conversa com o livro "Gente das areias". Apresentei este trabalho na 32ª RBA 2020. Dando continuidade as reflexões desenvolvidas em 2020, elaborei um novo artigo que foi aprovado para apresentação no CIHELA 2021, na Universidade de Lisboa/ Portugal. Buscando descrever as conversas das famílias de pescadores das comunidades tradicionais, dialogando com livro Gente das áreas, trabalhos de campo, documentos, vejo surgir em nossas conversas mediante a realidade pandêmica, outros temas e preocupações entre nossos interlocutores pescadores. Busco então, escutar os vivos e em suas falas capturar as lembranças dos mortos. Assim, as narrativas no ano de 2021 entre nós, trouxeram um novo elemento para a pesquisa. Quando perguntamos sobre o assunto, identificamos o lugar do suposto cemitério e as algumas histórias, como a de que chegavam de outros bairros mortos enrolados em lençóis e que eram enterrados em covas rasas. Lugar atualmente conhecido como a "rua da cruz" e que, Pedro pescador com seus completos 91 anos, afirmou em uma de suas últimas entrevistas quando registrou e documentou o conhecimento, antes de sua morte em 20 de fevereiro de 2022. O lugar entre os pescadores que parece guardar o segredo do litoral de Maricá no período da gripe espanhola, faz surgir entre os bairros da Barra de maricá e Guaratiba esse novo caminho etnográfico entre escolas, pescadores e comunidade.
Sistema Coral: Linhas de Vida em Assembleia. Uma reflexão sobre o uso dos oceanos, a crise climática, os mergulhadores, os corais e o mundo social existente sob a linha d"água: o Sistema Coral.
Autoria: Tina Coêlho
Autoria: Para um mergulhador estar na água é o mesmo que percorrer caminhos de caça em uma floresta tropical densa: sempre imprevisível e habitada. A principal diferença está no fato desta floresta estar submersa, exigindo do caçador habilidades fisiológicas diferenciadas. No mar tudo é adjacência. Este trabalho pretende comunicar sobre as percepções socioambientais dos mergulhadores de apneia da Reserva Extrativista Marinha do Corumbau, localizada no Banco de Abrolhos, (Bahia-Brasil), frente ao aquecimento global, às mudanças climáticas e aos desastres ambientais ocorridos no ano de 2019, nomeadamente, o branqueamento dos corais (Duarte, et al., 2020), e o derramamento misterioso de petróleo cru no ambiente (Soares, et al., 2020). Os desdobramentos destes acontecimentos experimentados, podem ser mensurados pela biologia, conforme observado nos artigos científicos, mas como captar as repercussões a nível cultural e socioambiental? A partir do método etnográfico me utilizei das imagens como ferramenta central e articuladora; de forma a dar espaço ao "cruzamento de perspectivas culturais", (MacDougall 1997). A câmara segue as linhas de vida, em busca da malha social. A escolha das imagens em detrimento da escrita foi feita a partir da enorme gama de detalhes e elementos sociais que podem estar contidas e revisitadas, em apenas uma cena (Pink 2001, Rose 2016, Sautchuk 2013). Optei pelo uso do filme como principal forma de recolha de informação pois contém em si a capacidade de oferecer detalhes e de se posicionar de forma eficiente nos múltiplos elementos que compõem esta pesquisa. Conforme referido por Sautchuk (2013) o que se pretende aqui é explorar mais a relação entre etnografia e filmagem, "como um meio potente para o engajamento etnográfico e a compreensão do significado das relações estabelecidas entre seres e coisas." A componente fílmica deste trabalho objetiva comunicar sobre uma realidade pouco visível: o mundo social existente sob a linha d"água, que chamo metaforicamente de Sistema Coral. Para dar conta da diversidade de detalhes e complexos imbricados de vidas e materiais relacionados a esta etnografia proponho a utilização do Sistema Coral como uma janela de observação para compreender o impacto do aquecimento global à escala local proposta. Como o conhecimento tradicional se reorganizará frente ao ambiente de comportamento cada vez menos previsível? A partir deste estudo de caso, tendo em perspectiva a situação de vulnerabilidade da população de Corumbau, pretendo dar visibilidade e aprofundamento à estas questões. Link do filme: https://tinacoelho9.wixsite.com/sistemacoral Senha: terraimagem7
A vida social dos peixes: crédito, escassez e raridade na circulação do pescado em municípios do sul dos Espírito Santo
Autoria: Márcio Filgueiras
Autoria: A pesquisa que coordeno no Ifes campus Piúma tem como um de seus pontos de atenção a esfera da circulação do pescado. Esta envolve desde doações voluntárias, pagamento pelo trabalho, ofertas religiosas até a comercialização. Estas diferentes esferas de circulação do pescado constituem o que poderíamos chamar de vida social dos peixes, na medida em que estes atuam como mediadores de relações sociais. Ao atravessar as diversas esferas de circulação dos peixes, o crédito aparece como um ponto chave para entendermos a natureza das relações sociais locais. Para compreender o fenômeno do crédito, vou explorar as diferenças entre o princípio da escassez e aquele da raridade. Enquanto o acesso ao crédito bancário está submetido à lógica da escassez, ou seja, é universalmente acessível, desde que o indivíduo demonstre possuir os recursos para pagá-lo, (recursos estes que são sempre escassos por definição, como nos ensina a teoria econômica clássica), o acesso ao crédito pessoal obedece à lógica da raridade, ou seja, não é universalmente acessível, mas apenas àqueles que dentro do sistema local hierárquico da confiança pessoal possuem o prestígio para acessá-lo.
Moralidades em disputa: pesca, turismo e proteção ambiental na comunidade pesqueira do Araçá, em Porto Belo/SC
Autoria: Silvia Beatriz Mendonca
Autoria: A proposta de trabalho é produto de análises preliminares decorrentes de pesquisa de campo em curso na comunidade tradicional da Vila do Araçá, em Porto Belo/SC/Brasil. O objetivo central desta é acessar os sistemas de conhecimento e os modos de organização desse povoado para desenvolver as atividades de pesca que promovem o sustento cotidiano de suas famílias. Procura-se compreender as relações comunitárias e o sentimento de pertença a este espaço geográfico. Acessando então a relação dessas pessoas com o território e uso que fazem do ecossistema, busca-se verificar se há interferências geradas a partir da instalação de Unidades de Conservação no território da comunidade, sua relação com a legislação ambiental que desde a década de 1930 restringem práticas pesqueiras outrora comuns, bem como com os processos de urbanização e turismo da região, que passam a ocorrer a partir da década de 1980. Utilizo os conceitos de "racionalidades" e de "senso de comunidade" para compreender a comunidade do Araçá e os conflitos presentes nesse espaço político ocupado por mim e pelos atores sociais envolvidos no campo durante a minha pesquisa. Tendo em vista que "os problemas de "racionalidade", são, na verdade, problemas em comunicar princípios" (OVERING,1985,p.19) já que, no que diz respeito a legislação ambiental, ambas racionalidades têm preocupações ecológicas, apesar de terem percepções distintas sobre o que são e para que servem os recursos naturais. No que diz respeito ao turismo, com ele chegam na comunidade os "de fora", aqueles que não estão ligados à comunidade por meio de sua família ou história, violentando os costumes daquela população que se vê tendo que lidar com comportamentos que não apenas não fazem parte do seu cotidiano como embriaguez, nudez, músicas em volume exageradamente alto e a própria ocupação dos espaços: das suas terras e das estradas por onde andam.
Pescadores e juventude de Marudá/PA: estão se afastando da pesca artesanal?
Autoria: Layse Rosa Miranda da Costa
Autoria: Este trabalho tem como objetivo explanar sobre o fenômeno que foi observado no município de Marapanim/PA, mais especificamente em um de seus distritos, chamado Marudá, que consiste no afastamento de pescadores e das gerações mais jovens da pesca artesanal, a partir da análises sobre como o sistema capitalista transformaram algumas relações socioculturais e econômicas na localidade com o passar do tempo. Estas observações foram possíveis a partir de um trabalho de campo realizado por mim, no ano de 2018, através do projeto chamado Recursos Naturais e Antropologia de Sociedades Pesqueiras. De acordo com as bibliografias, a pesca artesanal é uma das principais atividades econômicas da localidade, e passou por várias transformações no decorrer do tempo, pois a partir da década de 1930, com as construções de estradas que ligavam Marapanim/PA aos grandes centros comerciais, como Belém/PA e Castanhal/PA, a pesca, que era uma atividade voltada para o autoabastecimento dos moradores, passou a ser primeiramente voltada para estes mercados, ocasionando em mudanças econômicas e socioculturais, que refletiram no modo de vida dos pescadores e moradores, ocasionando a intensificação do trabalho da pesca artesanal. Porém, no ano de 2018, foi possível perceber entre os pescadores, e principalmente as gerações mais jovens, um certo afastamento em relação a atividade da pesca artesanal, e consequentemente, a busca por outras estratégias de sobrevivência, pois segundo relatado por alguns, a pesca já não era rentável como ocorria em décadas anteriores. Dessa forma, este trabalho tem como objetivo explicitar e analisar sobre as motivações do afastamento de pescadores e dos mais jovens em relação a pesca artesanal. Palavras-chaves: afastamento da pesca artesanal; pescadores; juventude; Marudá/PA.