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ISBN: 978-65-87289-23-6
GT01: A universidade como local da alteridade

Susana Abrantes, Carla Dias

A ampliação da universidade pública brasileira, somada às políticas de ação afirmativa, possibilitou mudanças profundas na composição do corpo social das instituições. Os estudantes comumente excluídos deste espaço de formação, chegam com histórias ativas que mostram uma complexidade de agendas, significados políticos e audiências, representando grupos que sobreviveram às invasões coloniais, à assimilação forçada e à escravização e que hoje lutam dentro de regimes dominantes, em resistência e reconexão aos seus valores ancestrais. O conhecimento produzido por eles nessa nova arena é resultado de situações existenciais, muitas vezes expressas por meio de histórias de vida, e reformulado nas relações interculturais e intercientíficas do cotidiano de ensino. Essas manifestações e formas de fazer mostram uma vitalidade cultural sentida dentro das universidades brasileiras que têm sido provocadas a pensar outras modelagens dadas por uma relação dialógica e a possibilitar outros pontos de vista e modificações no espaço de formação. Este GT convida pesquisadores e pesquisadoras a enviarem trabalhos que apresentem descrições, comparações e experiências sobre a universidade como o lugar da alteridade. Nos diferentes espaços da pesquisa, do ensino e da extensão há vivências distintas e inter-relacionadas sobre formas de conhecer, de sentir e de agir sobre o mundo que permitem um deslocamento do olhar docente em busca da construção de espaços mais democráticos.

Palavras chave: Universidade; Alteridade; Conhecimento
Resumos submetidos
A construção do Laboratório de Interseccionalidades, Equidade e Saúde: os nossos corpos implicados em pesquisas e práxis críticas
Autoria: Laura Cecilia López, Milena Cassal Pereira, Cauê Rodrigues, Natália Inês Schoffen Corrêa, Sabrina Feiber da Silva, Daniel Passaglia Junior
Autoria: O Laboratório de Interseccionalidades, Equidade e Saúde (LabIES), certificado pelo CNPq em 2021, é produto de construção coletiva iniciada quando nossos corpos diversos convergiram no espaço da Unisinos. Somos um grupo que produz pesquisa e práxis críticas, entrelaçando diferentes áreas de conhecimento, espaços de vida e de resistência. O grupo propõe intervenções sociais interseccionais e o uso de metodologias participativas para a elaboração de diagnósticos, bem como o delineamento/aplicação de ferramentas de avaliação e promoção da equidade em diálogo com problemáticas concretas levantadas por diferentes coletivos. Congrega-nos realizar pesquisas com abordagem interseccional de gênero, sexualidade, raça e classe, baseades na contribuição de três intelectuais: as antropólogas negras latino-americanas Lélia Gonzalez e Mara Viveros Vigoya, e a socióloga trans australiana Raewyn Connell. A publicação no Brasil do livro Interseccionalidade, de Patrícia Hill Collins e Sirma Bilge (2021) deu um impulso renovado às ideias do Laboratório, sendo que as autoras reivindicam a interseccionalidade como investigação e práxis críticas. À luz destes aportes, analisaremos três percursos dentro do grupo. O primeiro deles pode ser nomeado como o do "acesso afirmativo à universidade". Muitas/os das/os discentes que compõem o grupo acessaram a universidade graças a políticas de redistribuição e de reconhecimento que ampliaram o acesso ao ensino superior operantes com maior força na primeira década do Século XXI. Outro percurso é a contribuição para efetivação de políticas e direitos da população LGBTQI+ na cidade de São Leopoldo. E o terceiro relaciona-se com a realização de pesquisa-ação em um bairro periférico, sobre equidade de gênero e cuidados comunitários. Com esta reflexão, pretendemos ressaltar a relevância da produção de conhecimento que entrelace não só áreas de estudo diferenciadas, mas fundamentalmente baseada em epistemes que abram caminhos para a investigação colaborativa, para corpos engajados nas micropolíticas cotidianas, com vistas às transformações e a justiça social. Apostamos pela mudança de paradigmas para a valorização da ciência comprometida com as realidades sociais e com posturas cada vez mais dialógicas e inclusivas em relação às demandas de uma pluralidade de atores da sociedade.
Estudantes universitários indígenas do Oiapoque: apropriação de espaços acadêmicos e produção de conhecimento
Autoria: Vinícius Cosmos Benvegnú
Autoria: Este trabalho integra a pesquisa de tese de doutorado em Antropologia Social da Universidade Federal do Amazonas, que foi desenhada a partir de minha experiência enquanto professor substituto no Curso de Licenciatura Intercultural Indígena (CLII) da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP), entre os anos de 2017 e 2019, no município de Oiapoque, estado Amapá. O CLII surge, em 2007, de uma demanda direta dos povos indígenas do Oiapoque, que buscavam acesso à universidade e capacitação de seus professores e jovens. O curso vem oportunizando uma apropriação de conhecimentos, das linguagens e dinâmicas acadêmicas que possibilita, não somente uma reelaboração e reescrita dos processos históricos locais pelos próprios indígenas nos termos da academia, mas também legitimidade e protagonismo perante a sociedade de Oiapoque e do Amapá. A primeira parte da pesquisa da tese foi ler, sistematizar e analisar alguns Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) dos alunos dos quatro povos indígenas do Oiapoque - Karipuna, Galibi-Marworno, Galibi Kali"na e Palikur. Nessa etapa busquei analisar a produção de conhecimento indígena acadêmico, e compreender como a universidade têm possibilitado que os indígenas se apropriem desses espaços e passem a produzir materiais e conhecimentos próprios e legítimos sobre si e sobre a história local, que no limite, vêm acarretando diretamente nas suas realidades. Foram analisados 21 TCC"s da área de Ciências Humanas, que relatam experiências próprias dos autores e de pesquisas históricas e etnográficas. Uma infinidade de temas e orientações apareceram, contudo alguns tiveram maior ocorrência e se sobrepuseram a outros. Entre eles destacam-se: História indígena, Processos de escolarização e Educação escolar indígena, Relações com o Estado e missões religiosas, Organização Política. Ao por em análise esses documentos vemos que muitas das histórias, narrativas e fatos dialogam, descortinando dados e histórias em comum. É a partir dessas histórias particulares e dessa história em comum, que vemos como os indígenas vão historiografando as lacunas de alguma "história oficial". Após as análises e reflexões, iniciei uma série de conversas com esses autores indígenas para conhecer suas trajetórias de vida e escolar-acadêmica, entender os processos de pesquisa e elaboração dos TCC"s, e os vínculos e relações de pesquisa dos pesquisadores. Nas conversas busco, outrossim, compreender os efeitos sociais que os TCC"s têm ocasionado tanto nas comunidades, como no ambiente universitário. Por fim não menos relevante, a pesquisa conduz a reflexões e problematizações acerca do meu lugar enquanto professor e a prática docente, que expõem as lacunas da formação acadêmica para me relacionar e trabalhar didático-pedagogicamente com estudantes indígenas.
Ser, falar e pertencer: ativismo de intelectuais negras
Autoria: Debora Simões de Souza Mendel
Autoria: O objetivo desta comunicação é refletir sobre os processos de tentativas de silenciamentos das vozes das intelectuais negras. Estou interessada aqui na transformação das universidades brasileiras tendo em vista a implementação e desenvolvimento das ações ações afirmativas na modalidade das reservas de vagas para estudantes negros. Utilizarei três conceitos chaves a ideia do Movimento Negro como educador (GOMES, 2017), autodefinição (COLLINS, 2019) e narrativa na primeira pessoas (XAVIER, 2019). Tendo em vista que o meu ponto de análise é minha experiência enquanto cotista na pós-graduação e atuação como professora na rede federal de ensino. Não pretendo apresentar um texto/apresentação que denuncia a construção da universidade como espaço que exclui os corpos das mulheres, pois isso já está posto. Estou interessada, em caminhos a serem traçados com objetivo de fazer emergir das nossas aulas saberes emancipatórios. Compreendo que as nossas histórias precisam ser contadas por nós mesmas, dou ênfase no ato de fala como uma ferramenta importante para a luta contra as diversas opressões, como de raça e gênero. Desejo que possamos, enquanto intelectuais negras ativistas, combater o projeto de silenciamento criado pela colonização e levado adiante pela colonialidade e que possamos falar, sermos ouvidas e, consequentemente, possamos pertencer (KILOMBA, 2020). Minha voz só pode ser ouvida hoje, e escrever este resumo é uma maneira de ser ouvida porque outras mulheres negras lutaram. Nesse sentido, vou destacar a ideia de trajetória individual e coletiva, apresentando conceitos de outras duas autoras fundamentais para o feminismo negro no Brasil: Lélia Gonzalez e Sueli Carneiro para juntas teorizarmos sobre o eu e o outro; as repressões sistemáticas das nossas vozes, entre outras questões.
Trânsitos acadêmicos e a produção de conhecimento: Notas sobre a migração e as políticas da prática científica entre doutorandos brasileiros em Portugal
Autoria: Antonio Pedro de Barros
Autoria: A comunicação proposta é a parte inicial de uma pesquisa etnográfica em andamento acerca dos efeitos epistemológicos da migração para investigadores brasileiros em Portugal. As sucessivas crises políticas que se aprofundaram no Brasil a partir de 2015, com a abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff, e a posterior consolidação institucional da extrema-direita, em 2018, provocaram transformações drásticas na condução de algumas políticas públicas. O campo da ciência e da educação, em especial, foram marcados por cortes sucessivos de financiamento e pela intensificação do processo de precarização das condições de trabalho. Diante desse quadro, houve um crescimento no fluxo de emigração de pesquisadores, em especial daqueles em fase de formação ou em estágios iniciais da carreira e Portugal se configurou como um dos principais destinos para aqueles das áreas das Ciências Sociais e das Humanidades. O número de brasileiros na academia portuguesa vem subindo num ritmo próprio e constante, independente das ondas de migração no geral. Apresento uma breve contextualização deste fluxo migratório, baseado em alguns dados estatísticos e históricos sobre como as transformações conjunturais no Brasil afetaram as condições materiais e simbólicas de trabalho científico e podem estar associadas a esse fenômeno. Junto a isso, busco apresentar a sua singularidade e como a migração acadêmica recente se distingue perante as outras formas de mobilidade acadêmica financiadas pelo Estado brasileiro, que já foram majoritárias nas interações científicas entre os dois países. Esse material é enriquecido com dados etnográficos reunidos na pesquisa de campo em andamento em alguns centros de formação avançada na área das ciências sociais em Lisboa. Tenho tido especial atenção às dinâmicas de organização e de interação dos ambientes acadêmicos em Portugal, às representações acerca do significado do Brasil e de Portugal enquanto locais de produção e enunciação do conhecimento científico, e, sobretudo, às objetivações discursivas dos processos vividos subjetivamente de deslocamento de classe, status, gênero e raça decorrentes da experiência migratória.
Relação entre estudantes no espaço privado e público na pandemia: reflexões a partir do Gilberto Velho
Autoria: Mamadú Cissé
Autoria: A concepção de que ser humano é interdependente, logo, não consegue se reproduzir social e culturalmente caso seja isolado do restante do seu entorno social tem sido um dos postulados em torno do qual se reúne um amplo consenso dentro das Ciências Sociais de forma geral. Não obstante, se esta afirmação possui argumentos que o torna justificável per si - teórica e empiricamente - também não deixa de ser verdade que a referida convivência inter-humana é permanentemente pautada por conflitos, cedências, convenções e outras formas de viabilizar uma mediação com máxima viabilidade possível dessas relações sociais. É a partir destes pressupostos que o presente trabalho reflete acerca das tensões entre as esferas privada e pública durante a pandemia da Covid-19. Para o efeito, utilizei a base teórica dos estudos da Antropologia Urbana e também me servi de dados coletados a partir da aplicação de entrevistas online com estudantes do ensino superior a nível de graduação na UNILAB - Campus dos Malês, localizado na Bahia, Brasil. Em termos dos elementos constatados e meus achados, na sessão das considerações finais, aponta-se que as situações ou potenciais contextos de conflito têm sido mediadas e apaziguadas por estratégias definidas e ou em definição durante a convivência cotidiana entre os estudantes que integram o público selecionado para a entrevista.
A presença de estudantes indígenas na universidade: reflexões a partir da interculturalidade e diversidade
Autoria: Cíntia, Maristela Oliveira de Andrade, María Elena Martínez-Torres
Autoria: Este trabalho traz a discussão do conceito de interculturalidade e diversidade, como alicerces que fundamentam a construção de espaços acadêmicos mais plurais etnicamente, a partir da reflexão da universidade como lócus do repasse de saberes e práticas hegemônicas colonialistas. O conceito de interculturalidade, entendido a partir da concepção de que há um saber dominante que precisa ser descolonizado e desconstruído, leva ao questionamento: Qual o significado da presença dos estudantes indígenas nas Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) e como essa presença é capaz de questionar as teorias "científicas" postas como universais? A pesquisa bibliográfica, aliada à prática profissional da autora como assistente social na Pró-Reitoria de Assistência e Promoção ao Estudante da UFPB, onde é operacionalizado o Programa Bolsa Permanência e como doutoranda no PPGA/UFPB trouxeram subsídios para refletir sobre questões relacionadas à alteridade na Universidade. Ferramentas como a observação participante e entrevistas viabilizaram tal estudo, considerando que nos espaços profissional e acadêmico foi possível a convivência da autora com estudantes indígenas. Dentro desse contexto, o Sistema de Cotas e o Programa Bolsa Permanência constituem-se como avanços na discussão sobre a diversidade nas Universidades, sendo considerados pilares para a diversidade na Universidade, com forte apelo ao exercício da alteridade em todas as instâncias institucionais. A diversidade ainda representa um desafio para as IFES, quer para consolidação de uma universidade menos hegemônica como pela capacidade de romper paradigmas e abrir espaços de conivência, com práticas interculturais, onde há trocas de saberes e não imposição de um saber único!
INCLUSÃO SOCIAL ATRAVÉS DO EAD PARA AGENTES DA SEGURANÇA PÚBLICA: uma abordagem sobre o curso de Tecnologia em Segurança Pública e Social - UFF/CEDERJ
Autoria: Thayná Moreira Cardoso de Carvalho Grandin
Autoria: Resumo: O trabalho terá por objetivo discutir como a Educação a Distância possibilitou a inserção daqueles que, em razão de alta demanda de trabalho e regimes de escala, possuem dificuldade de frequentar um curso de nível superior no modelo de ensino presencial. Nesse sentido será destacada a relação civil-militar no âmbito universitário, e mais especificamente, será demonstrado o processo acadêmico de socialização dos agentes de Segurança Pública como alunos da Universidade, a partir da observação do Curso de Tecnologia em Segurança Pública e Social, ofertado pela Universidade Federal Fluminense (UFF) em parceria com o consórcio Centro de Educação Superior à Distância do Estado do Rio de Janeiro (CEDERJ/CECIERJ), que proporciona ensino público de qualidade para profissionais da área de segurança pública, promovendo a inclusão social desses profissionais no ambiente acadêmico e contribuindo para a democratização do ensino em nosso país. E atuando como tutora presencial e tutora-coordenadora no Polo Regional de São Gonçalo, município da região metropolitana do Estado do Rio de Janeiro, pretendo desenvolver o estudo com base nas entrevistas e observações etnográficas realizadas a partir do lugar que ocupo neste ambiente de aprendizagem. Palavras-chave: Inclusão Social, Segurança Pública; EAD. Referências Bibliograficas: ARAGON, Luiza A. A memória que não leva à justiça: uma etnografia das moralidades e dos discursos presentes no Tecnólogo em Segurança Pública e Social da Universidade Federal Fluminense. 2018. Tese de Doutorado (Programa de Pós Graduação em Antropologia), Universidade Federal Fluminense, Niterói, Rio de Janeiro, 2018. CASTRO, Celso. O Espirito Militar: um antropólogo na caserna. 2ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004 GERALDO, Pedro. H. B. e KANT DE LIMA, Roberto. Conflitos em formação: A experiência da convivência civil-militar no Curso de Tecnólogo em Segurança Pública a distância da Universidade Federal Fluminense. In: GT01 "Administração de conflitos em perspectiva comparada" 39º Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu, Minas Gerais,MG: Outubro, 2015. KANT DE LIMA, Roberto. Polícia, justiça e sociedade no brasil: uma abordagem comparativa dos modelos de administração de conflitos no espaço público. Revista de Sociologia e Política, Curitiba - Paraná, n.13, p. 23-38, 1999 SILVA, Robson. R. d.. et al. Entre a caserna e a rua: o dilema do "pato". Uma análise antropológica da instituição policial militar a partir da Academia de Polícia Militar D. João VI. Niterói/Rio de Janeiro: Ed. UFF. 2011 VERÍSSIMO, Marcos. et. al. Quando a polícia vai à Faculdade: "inclusão social" ou "choque cultural"?. In: XVII CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, 2015.
É Subalterno ou Subversão?: Das Ações Afirmativas ao Rompimento com o Epistemicídio
Autoria: Rafaela Rodrigues de Paula, Steffane Pereira Santos
Autoria: Com a aproximação dos 10 anos da implementação da Lei 12.711/2012 mudanças foram colocadas em curso na operação e nos modos de fazer epistemológico dentro das universidades públicas brasileiras. O que, enquanto estudantes negras, temos executado na universidade, é um processo continuado de formação de redes de alunes negres (CASSIANO, 2022) que engendram, por sua vez, um espaço confortável para a autodefinição, criando uma centralidade subversiva, como aponta Sofia Maria Nicolau (2021). Assim, não somente socialmente e espacialmente o âmbito das universidades é modificado, como também as produções que são realizadas por estudantes negres e indígenas. Isto posto, por meio de um revisão teórica que discute a colonialidade do saber (MIGNOLO, 1995) estabelecida ao longo do tempo, seus efeitos na prática da produção acadêmica e no estabelecimento do epistemicídio (CARNEIRO, 2005). O presente trabalho objetiva traçar como a Lei de Ações Afirmativas, ao promover a inserção de alunes negres nas universidades, consequentemente propõe um giro epistemológico nas produções da universidades, que são questionadas e interpeladas por esses estudantes ao ocuparem uma nova posição enquanto produtores e não objeto do conhecimento (KILOMBA, 2019), bem como, propicia a permanência e criação de redes de apoio para esses no ambiente acadêmico. Assim incorpora-se duas perspectivas de análise, a saber: (1) o lugar da experiência (SCOTT, 1998) e posicionalidade (HARAWAY, 1995) de nossa trajetória de estudantes negras cotistas em uma universidade federal, e (2) a revisão e mobilização de epistemologias contra-hegemônicas e decoloniais manipuladas por intelectuais negres na área das Ciências Sociais que travaram embates frente ao epistemicídio que silencia as nossas vozes, constituindo parte da resistência e da materialização do sonho insubmisso dos nossos, que foram potentes vetores para que possamos estar ocupando este espaço atualmente, construindo redes de resistência e permanência. Rompendo com assim com a lógica de operação do silenciamento de corpos subalternizados e iniciando passos para que corpos subalternos possam falar (SPIVAK, 2010).
A identidade étnica no ensino superior: o caso dos estudantes indígenas da Unicamp
Autoria: Iandra Moretti
Autoria: Este trabalho investiga os processos de reelaboração da identidade étnica no ensino superior, tendo em vista principalmente o caso da Unicamp. Na Unicamp, o vestibular indígena aparece como uma proposta somente após a greve estudantil ocorrida em 2016. Tal greve tinha como uma de suas pautas a reserva de vagas para pretos, pardos e indígenas. Depois de um longo debate que sucedeu a greve, com uma forte presença da experiência da implementação do vestibular específico indígena na UFSCar, em 2017 é aprovado o vestibular indígena na Unicamp. Aplicado pela primeira vez em 2018, a primeira turma ingressa no ano de 2019, ou seja, a universidade possui uma experiência recente com a crescente entrada de estudantes indígenas. São ao todo, atualmente, 234 estudantes indígenas matriculados nos dois campi da universidade. Com isso, procura-se expor, para além dessa contextualização da implementação recente do vestibular indígena na Unicamp, um balanço bibliográfico das formas com que o ingresso na universidade mobiliza, para o conjunto dos estudantes, uma reflexão sobre projeto profissional que pode implicar em ponderações a respeito do seu lugar no mundo e seu projeto de vida num sentido mais amplo. A maioria das pesquisas feitas sobre estudantes indígenas, no Brasil como em outros países, concernem universidades públicas. Depreende-se dessa literatura que há uma politização do "ser estudante indígena". Constituem-se com frequência associações de estudantes indígenas, na maioria das vezes envolvendo diversas etnias, favorecendo a produção de identidades pan-indígenas. As lideranças dessas organizações reivindicam políticas específicas de acesso e permanência, questionam a falta de diálogo com saberes indígenas na universidade, articulam-se com organizações indígenas nacionais e regionais. São frequentemente evocados por essas lideranças a importância da manutenção do contato com (ou do retorno às) suas comunidades. Observa-se ainda, de maneira recorrente, a apropriação por estes estudantes de instrumentos e técnicas de comunicação nas redes sociais e uma importante visibilidade e valorização da participação das mulheres indígenas. Neste trabalho, para além desse lugar militante na universidade, procura-se expor a existência de outras formas de experimentar a universidade pelos estudantes indígenas ao levar em consideração a heterogeneidade desse grupo, indicando que as relações construídas na e com a universidade não é unívoco ou homogêneo, mas depende tanto de repertórios, redes de contatos e desejos de diferentes estudantes, assim como dos distintos convites e oportunidades que as universidades oferecem.