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ISBN: 978-65-87289-23-6
GT49: Integrando biologia e cultura: história, pesquisas atuais e perspectivas futuras

Velan Neto, Pedro da Glória

Desde suas primeiras investigações, na primeira metade do século XIX, até os dias atuais, a Antropologia Biológica brasileira tem se apresentado multifacetada, com uma profusão de estudos com reconhecida inserção na comunidade antropológica internacional. Não obstante, são ainda escassos os espaços de discussão que abordem as interfaces entre Biologia e as Ciências Humanas no país, marca da Bioantropologia contemporânea, incluindo em um mesmo fórum pesquisas realizadas em Etnobiologia, Antropologia Ecológica, evolução biocultural, Antropologia Forense, Bioarqueologia, Antropologia Genética, Socioecologia da Saúde, Primatologia, entre outros campos correlatos. Sempre orientado pelas recentes e cada vez mais proeminentes discussões em torno do que se tem chamado internacionalmente de uma Antropologia Integrada, em que perspectivas teórico-metodológicas de mais de um campo da Antropologia e áreas afins são postas em diálogo, este GT, nesta segunda edição, mantém os objetivos da anterior. Segue com o propósito de se consolidar como um espaço aberto, dentro das RBAs, a investigações de natureza teórica, experiências em trabalho de campo, bem como relatos de iniciativas institucionais, que contemplem os aspectos históricos, os múltiplos temas atuais, as perspectivas futuras e, sobretudo, as possibilidades de diálogo entre biologia e cultura no e a partir do Brasil.

Palavras chave: Natureza e Cultura; Antropologia Integrada; Antropologia Biológica e Arqueologia
Resumos submetidos
"Uma abordagem promissora": os transplantes de células-tronco para a cura do HIV
Autoria:
Autoria: Nas últimas quatro décadas, diferentes biotecnologias têm sido experimentadas em busca da prevenção, do controle, da imunidade e da cura para a infecção pelo HIV, que afeta aproximadamente 40 milhões de pessoas em todo o mundo. Dentre essas abordagens, encontram-se os transplantes de células-tronco hematopoiéticas - células adultas (portanto, não embrionárias) que possuem a capacidade de se tornarem células especializadas do tecido sanguíneo e do sistema imune -, realizados desde os primeiros anos da epidemia de HIV/aids para o tratamento de cânceres e infecções associadas à progressão da doença. O primeiro caso de cura da infecção pelo HIV foi alcançado através desse procedimento terapêutico há pouco mais de uma década, no "paciente de Berlim" (como ficou amplamente conhecido). Nesse caso, contudo, as células transplantadas apresentavam uma diferença considerada central para a cura: o doador possuía uma mutação genética, chamada CCR5-delta-32, que conferia resistência à infecção pelo HIV. Germinava, de acordo com os médicos e cientistas responsáveis, "uma abordagem promissora" para a cura do HIV. Desde então, outros experimentos biomédicos têm sido realizados nesse sentido. Até o momento, transplantes de células-tronco com a mutação promoveram a cura em outros dois homens (em Düsseldorf e Londres) e, mais recentemente, foi anunciado o possível primeiro caso de cura em uma mulher (em Nova York). Tendo em vista este cenário, no presente trabalho pretendo discutir como diferentes agentes, agenciamentos e devires se emaranham e transbordam aos procedimentos experimentais. Para tanto, recorro a materiais heteróclitos - textos jornalísticos, cartas, entrevistas concedidas e artigos científicos -, coletados durante pesquisa de doutorado em andamento. E, em termos conceituais, proponho diálogos com a antropologia da ciência e da tecnologia aliados aos estudos em HIV/aids, às filosofias da diferença e às epistemologias feministas e queer. Afinal, como a cura adquire materialidade e é performada nestes casos?
Flora e fauna ressignificadas em sítios rupestres do Paraná: entrelaçando bioarqueologia, etnobiologia e identidades regionais
Autoria:
Autoria: No estado do Paraná, sul do Brasil, já foram documentados 400 sítios arqueológicos com pinturas rupestres e 50 com gravuras, alguns com as duas manifestações estéticas, além de sobreposições. Em alguns abrigos, especialmente no Campos Gerais, foram documentados grandes painéis bem como cenas isoladas, possivelmente relacionados a narrativas míticas, com rica diversidade faunística e florística. Aparecem áreas manejadas de árvores nativas, como pinheirais de araucárias e espécies consorciadas, além de plantas domesticadas, o milho e a mandioca, entre outras. Muitas representações mostram cenas de animais e plantas associadas a figuras humanas, algumas com seres sobrenaturais, híbridos, e a presença de máscaras e instrumentos musicais. Parte dos animais parece apresentar identificações e/ ou marcas clânicas, com sequências de círculos e pontos, revelando assimetrias e a importância de integrar discussões antropológicas. Os pigmentos das pinturas, e que ocorrem em algumas gravuras, orgânicos e inorgânicos, possuem avermelhadas, amarelas, marrons e pretas. Em vários sítios com arte rupestre, no Paraná, datados entre 9 mil anos AP (antes do presente) e 300 anos AP, foram caracterizadas estruturas funerárias, tanto de sepultamentos primários, fletidos e estendidos, como secundários, algumas vezes em conjuntos e em fardos funerários, e ainda de cremação. Esses sítios rupestres são relacionados a vários povos originários, de paleoíndios a ceramistas, e a diferentes paisagens e litologias, ocorrendo da costa litorânea até o oeste paranaense. A ampliação das pesquisas, com filtros teóricos e novas tecnologias, possibilita caracterizar a diversidade da arte rupestre no Brasil. Muitos abrigos estão sendo impactados, devido a fragilidades multiplicadas por mudanças nas políticas públicas e na diminuição da aplicação de normativas ambientais e patrimoniais, sendo urgente a implementação de estratégias de gestão de longa duração e aproximação das comunidades locais. Entrelaçar dados de arte rupestre com a arqueologia da morte, a cultura material e as cronologias, que evidenciem territórios, podem colaborar na discussão de identidades regionais. Diferentes povos pintavam e gravavam nas rochas buscando delimitar o território, expressar a complexidade das culturas, evidenciar as relações com o ambiente que ocupavam e marcar elementos míticos presentes no imaginário social, e somente os estudos sistemáticos podem trazer novos horizontes. Uma gestão eficiente de sítios é fundamental para conservar essa rica memória estética e simbólica.
A Ancestralidade na Antropologia Forense e seu contexto no Brasil
Autoria:
Autoria: A Antropologia Forense analisa o corpo humano em um contexto jurídico, envolvendo cadáveres em avançado estado de decomposição e impossibilitados de serem reconhecidos. A Antropologia Forense poderá viabilizar a identificação positiva por meio de informações provenientes dos ossos. O processo de identificação é feito por meio da criação de um perfil biológico que envolve a avaliação de quatro parâmetros, entre os quais a ancestralidade, também designada por afinidade populacional. A ancestralidade é controversa dentro da Antropologia Forense e, especialmente no Brasil, onde essa área das ciências forenses não é regulamentada e a população é miscigenada. Dessa forma, o objetivo deste trabalho foi realizar um levantamento dos métodos de análise de ancestralidade empregados nas perícias criminais realizadas no Brasil. Para isso, desenvolveu-se um questionário direcionado aos respectivos profissionais das 27 Unidades Federativas do Brasil (tendo obtido um retorno de 13) sobre os métodos de análise da ancestralidade aplicados nos casos forenses. Foi possível observar a disparidade entre os procedimentos utilizados nas diferentes regiões, tanto quanto à realização da pesquisa da ancestralidade, quanto ao método utilizado, sendo o mais aplicado o Método Hefner (2009). Isso demonstra a falta de padronização e uniformidade da Antropologia Forense no Brasil, sendo também um indicativo da falta e necessidade de métodos que se adaptem à grande mistura populacional que é a maior característica dos brasileiros.
Representações geográficas da Ilha do Maranhão e regiões circunvizinhas no século XVII retratadas na obra do missionário Claude D"Abbeville: um olhar antropológico
Autoria:
Autoria: Claude D"Abbeville, desembarcou no Maranhão em 1612, acompanhando a expedição comandada por La Ravardière, e realizou vários apontamentos referentes a geografia (relevo,clima,fauna,flora) e antropologia local, resultando na obra de sua autoria, "História da missão dos padres capuchinhos na Ilha do Maranhão e terras circunvizinhas". O objetivo deste estudo consistiu em analisar referências geográficas contidas na obra, e a partir do conjunto desses registros, compreender a lógica dessa cartografia colonialista. Como estratégia para obtenção de informações relativas a geografia, os franceses catequizaram e ofereciam proteção contra inimigos aos índios convertidos que eram transformados em súditos da coroa francesa, para assim estreitar laços e deste modo, impor a sua cultura dominante para obtenção de notas geográficas de seu interesse