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ISBN: 978-65-87289-23-6
MR15: Criando gentes e antropologias: maternidades dentro e fora das universidades

Coordenação: Renata Albuquerque (FCL)

Participantes: Dayana de Cordova (UFSCar), Marina Novo (Unicamp), Tatiane Duarte (UnB)

Resumo:
As maternidades têm ocupado cada vez mais espaço nas discussões acadêmicas, mobilizando pesquisas, publicações e articulações variadas nos diferentes campos das Ciências Sociais. Esse cenário se acentuou no contexto da pandemia de COVID-19, com o escancaramento da centralidade das tarefas reprodutivas na organização da vida social. A sobrecarga materna expõe a relação do trabalho reprodutivo com o trabalho acadêmico e convida novos diálogos sobre o trabalho em antropologia. Trabalhos de campo prolongados, imersão em contextos perigosos, rotinas de trabalho e estudo incompatíveis com o cuidado de crianças, ambientes universitários despreparados para o acolhimento de lactantes, financiamentos de pesquisa que não consideram as especificidades das dinâmicas familiares. Esses e outros tantos cenários são recorrentes no fazer antropológico e têm sido aceitos como universais, servindo como parâmetro para a organização da disciplina. Esta Mesa Redonda tem o objetivo de discutir sobre como as antropólogas articulam o trabalho acadêmico e intelectual com o manejo das redes de cuidado em que estamos inseridas. Buscamos refletir sobre o que significa ser mãe e antropóloga, considerando as particularidades (ou lugares comuns) que o campo da antropologia traz para essas experiências da vida e identificando os desafios enfrentados pelas pesquisadoras-mães em um cenário político que promove a precarização do trabalho com pesquisa.

Palavras chave: Maternidades; Trabalho acadêmico; Trabalho reprodutivo
Resumos submetidos
Mães em campo: sobre fazer etnografia pós-maternidade
Autoria: Marina Novo
Autoria: A antropologia enquanto disciplina tem, na etnografia, um de seus principais diferenciais metodológicos e críticos. A combinação do processo de imersão em campo com a posterior imersão textual compõem uma prática que alimenta e é alimentada pela teoria, criando um corpus bastante robusto que dá substância à disciplina. Ao longo das últimas décadas, muito já se debateu acerca do fazer etnográfico e seus desafios e peculiaridades, especialmente no que diz respeito à presença (ou não) do autor no texto, bem como à própria ideia de autoria. Todavia, muito pouco (ou nada) se falou sobre as condições de produção desse conhecimento, quando se trata de pesquisadoras que são ou que se tornam mães ao longo de suas pesquisas. Quais as implicações dessa transformação na condição de vida dessas pesquisadoras em suas práticas de pesquisa e produção de textos? De que forma a maternidade impacta ou não, nas relações de pesquisa e nas etnografias produzidas? A intenção desta fala será, a partir do relato de pesquisadoras-mães, refletir, por um lado, sobre a invisibilidade e as dificuldades impostas pela maternidade nos espaços acadêmicos e, por outro lado, sobre os potenciais impactos positivos dessa experiência de criar gente no processo de produção de etnografias.
Esconderijos e subterrâneos das maternidades na antropologia
Autoria: Tatiane Duarte
Autoria: Esta comunicação se inspira na retomada da história da antropologia considerando a produção intelectual e a contribuição de mulheres para a formação da nossa disciplina (CORREA, 2003). Sabemos que sua fundação tem referência colonial e a definição de seus cânones e clássicos foram constituídos hegemonicamente por homens do norte global construindo um quadro epistêmico com assento para bem poucos. Diante de fundadoras e de referências teóricas faltantes e de não-ditos sobre as contribuições teóricas de mulheres para a antropologia (BRANCO et al., 2018), alocamos as maternidades como mais um marcador de ausência e de exclusão. Contemporaneamente, antropólogas mães continuam enquanto posicionalidades presentes nas construções de pesquisa, nas escritas etnográficas, nos aportes teóricos e nas posições ocupadas, mas pouco reveladas, menos ainda se evidencia como muitas de nós não ocupamos cargos efetivos nas universidades ou quando ocupamos possuímos condições de trabalho mais precarizadas. Considerando as maternidades encobertas em nossas antropologias, dialogamos com o debate feminista e as discussões públicas atuais que reconhecem os enfrentamentos a serem feitos para a concretização de igualdade e de direitos. Até por que, mesmo que mães e crias existam, diversamente, em todos os grupamentos sociais que estudamos, não são ainda reconhecidamente vozes epistêmicas, são corpos objetificados e subalternizados. Para as mães, os tempos parecem ter sido sempre extremos, inclusive entre nós, antropólogas. Diante desse desafio, consideramos a maternidade enquanto fato social e composição possível às mulheres pesquisadoras, mas que apresenta novos princípios e limites ao nosso tempo de trabalho exclusivo. E que, de modo pungente, contribui para novos olhares epistemológicos e perspectivas metodológicas porque provoca, literalmente, a repovoação de nossos fazeres antropológicos e de nossos agenciamentos políticos como intelectuais em uma sociedade estruturalmente desigual.
Maternidade: condições e perspectivas de trabalho na antropologia
Autoria: Dayana de Cordova
Autoria: A maternidade pode ser uma experiência radical que altera (em diferentes modos e níveis) o feixe de relações e as conexões que constituem a vida de uma pessoa. É notório para nós, pessoas antropólogas, o quanto em sociedades ocidentais o cuidado, o fazer e suportar vidas, é um trabalho tido como menor, não reconhecido e mal remunerado, quando remunerado - e, não por acaso, relegado às mulheres. Mas o que se passa em relação a isso nos meandros da antropologia, um campo de estudos onde nos percebemos como progressistas? Em que medida questões dadas mundo afora, como a exclusão de mulheres mães do mercado de trabalho, se passam também na antropologia? Considerando o campo acadêmico como sendo, hoje, o principal espaço para a atuação da pessoa antropóloga no Brasil, quais são as dificuldades impostas às mulheres que se tornam mães já estando institucionalizadas? E para aquelas que se tornam mães antes da entrada na academia como docentes e pesquisadoras, há um depois dentro da antropologia? A presente fala se construiu a partir de conversas com diferentes mulheres mães antropólogas e suas experiências sobre a prática profissional atravessada pela maternidade.