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ISBN: 978-65-87289-23-6
GT31: Diálogos antropológicos com o fazer científico, literário, artístico ameríndio

Alexandre Aquino, Diego Soares

A proposta do GT busca dialogar com a ciência, a literatura, o cinema e a arte ameríndia com o intuito de compreender sua repercussão no fazer antropológico. No contexto atual, em que o saber acadêmico continua (re)produzindo determinado modelo de escrita, vemos o surgimento de escritores indígenas, que sugerem, ao mesmo tempo em que elaboram suas reflexões num estilo mais técnico, que o debate científico deve incorporar filmes, música e arte (de autores) indígenas, que são motivados a partir de sua herança sociocultural, situada na oralidade. Esta via de mão dupla reafirma a importância de análises já realizadas na disciplina, nas quais linguagens não escritas constituem o próprio potencial da produção antropológica (ver Gallois & Carelli 1992; Ingold, 2015). Interessa-nos reunir trabalhos que permitam refletir sobre estas manifestações e produções indígenas, seja demonstrando suas interações e inserções no contexto universitário, especialmente no que se refere a participação e/ou elaboração de processos seletivos, projetos didáticos, publicações, entre outras práticas acadêmicas de ensino, pesquisa e extensão, seja extrapolando os muros da universidade, considerando diversas expressões contemporâneas em cybercultura, nas pinturas de murais nas cidades, nas instalações e manifestações artísticas em eventos, bienais, feiras, shows de música, que adquirem cada vez mais relevância em âmbito nacional e internacional.

Palavras chave: etnologia; intelectuais; saberes.
Resumos submetidos
A beleza Mebêngôkre n(d)os Filmes da Aldeia A'Ukre
Autoria: Amilton Rosa de Lima
Autoria: A troca envolvendo artefatos faz parte do contato entre brancos e ameríndios desde seu início. Materiais de agricultura, de pesca, utensílios de cozinha, eletrodomésticos, assim como os equipamentos audiovisuais. A possibilidade do registro, seja como documento histórico para salvaguardar memórias, ou distribuir entre os outros grupos imagens de seus costumes, seja como documento político, como prova sobre promessas feitas para pressionar autoridades, atesta suas potencialidades para utilização. Desse interesse foi-se consolidando uma vasta produção cinematográfica indígena e esse trabalho busca explorar esse fazer cinema, focando a produção da aldeia mebêngôkre A"Ukre, atentando, ainda, para os agentes que participam dessa construção e de sua transformação.
Uma Antropologia Simétrica do Parto Indígena Amazônico: o caso das parteiras do Alto Rio Negro (AM)
Autoria: Linda Luz
Autoria: Apresento neste trabalho os delineamentos iniciais de uma pesquisa de mestrado realizada no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFU, tendo como objetivo realizar uma etnografia de técnicas manuais praticadas por parteiras indígenas das etnias Baré e Baniwa, na realização de partos tradicionais em comunidades da região do Alto Rio Negro (AM). Busca-se estabelecer uma relação entre as técnicas manuais associadas ao ato de "partejar" e os conceitos indígenas de corpo e pessoa, contrapondo essa perspectiva aos conceitos que orientam as práticas e técnicas de parto da biomedicina, conforme realizadas em clínicas e hospitais. A pesquisa visa produzir um registro etnográfico dessas técnicas e saberes das parteiras indígenas, contribuindo para a salvaguarda deste importante patrimônio imaterial. Em diálogo com a etnologia ameríndia, a Teoria Ator-Rede e a antropologia simétrica, busco apresentar o arcabouço teórico-metodológico da pesquisa a partir de um diálogo com autores como Tim Ingold, Viveiros de Castro e Márcio Goldman (entre outros), buscando uma aproximação com os conceitos e o pensamento ameríndio. Tendo em vista que essas práticas de parto ocorrem associadas ao uso de outras substâncias - como plantas medicinais, alimentos específicos e defumação, por exemplo - intento analisar como o toque e a esfregação de determinadas regiões do corpo se relacionam com o agenciamento de outras forças e energias que podem promover um "bom parto", tendo como finalidade refletir sobre a relação entre humanos e não-humanos e a configuração sociopolítica da agência terapêutica em contextos etnológicos específicos. Ao final, trataremos de delinear os contornos iniciais de um estudo comparativo mais amplo sobre as técnicas de parto entre os povos indígenas amazônicos e as possibilidades de diálogo com outras práticas alternativas de fisioterapia obstétrica, incluindo uma reflexão sobre as possibilidades de traduções interculturais envolvendo a promoção do que tem se denominado de "parto humanizado".
O processo de demarcar a escrita, a antropologia e a universidade a partir das existências coletivas de mulheres Karipuna
Autoria: Ana Manoela Primo dos Santos Soares
Autoria: Esta proposta de comunicação é realizada por uma indígena do povo Karipuna do Amapá, que realiza pesquisas em antropologia com um grupo de "indígenas mulheres" de seu povo origem. Estas pesquisas passam por relações que envolvem gênero, geração, parentesco, ritual, território, oralidade, memória, escrita e desenhos. Este grupo de mulheres com quem realizo as pesquisas são "parentas" muito próximas, pesquiso com minha mãe, minhas tias maternas e com a memória de minha avó. Enquanto as primeiras ainda estão vivas, esta última já se ancestralizou e foi morar em um "mundo invisível, o mundo dos karuãna". Todas estas mulheres são originárias da aldeia Santa Isabel, na Terra Indígena Uaçá (Oiapoque - Amapá). Nesta comunicação pretendo explicar como são os processos para a realização destas pesquisas, que já envolveram a realização de apresentações, artigos, tcc, dissertação, fotografias e desenhos. Busco responder como as histórias e conhecimentos das mulheres Karipuna de minha família formam a tecitura e a materialização destas pesquisas? Quais são seus sentimentos com relação a estes estudos e quais são os meus sentimentos para com as pesquisas e estas parentas? Quais são os retornos que já foram realizados e quais os possíveis retornos que ainda podem ocorrer com relação a estes estudos para nossas comunidades? Como ocorrem as escolhas das oralidades, memórias e bibliografias que comporão as pesquisas? Quais são os afetos, as afinidades, as dessemelhanças, as tensões e as disputas para realização de pesquisas com "indígenas mulheres" dentro dos territórios de nosso povo e dentro dos territórios acadêmicos? Pois nas universidades se existem aliados, alianças, mundos e territórios indígenas, também existem teorias, narrativas e territórios que estão em disputas. Além do racismo e violências que as universidades também podem produzir e reproduzir com relação aos povos originários. Este é um caminhar pelos anos de pesquisa que já realizei. É uma reflexão de como estou trazendo para a universidade as existências de mulheres que me formam como parenta e mulher Karipuna, mas também como trago a minha própria existência, pois somos coletividade, somos mulheres povo. Porém, compreendendo que as pesquisas também são um meio que me tece como Karipuna, pois a partir do que as mulheres foram me narrando e realizando para as pesquisas, também fui me apropriado das histórias, filosofias, ciências, antropologias e artes Karipuna. Neste território de pesquisa parto de minhas próprias experiencias com o que vem dos "corpos-territórios" das mulheres de minha família e como vamos demarcando a universidade com nossas existências ancestrais e coletivas. Palavras-chaves: Karipuna do Amapá; Indígenas Mulheres; Demarcar a universidade.
Onde começa o parentesco Mbyá-guarani? Notas sobre Ayvu Rapyta e os parentes fundadores
Autoria: Kauana Maria Santos Neves
Autoria: León Cadogan, reconhecido pesquisador paraguaio, teve seu texto "Ayvu Rapyta" parcialmente publicado pela primeira vez em 1953. Esse trabalho é fruto de anos de convivência entre os Mbyá-guarani, os quais lhe confiaram suas sagradas narrativas de fundação do mundo, revelando parte principal de sua cosmologia. Tal narrativa possuí problemáticas de tradução que aqui não serão abordadas³, entretanto, na sua versão traduzida para o espanhol, disponibilizada em 1959 pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP) é possível identificar vários elementos que são ditos e realizados pelos Mbyá-guarani e expostos quando cruzam os caminhos dos etnógrafos. Os Mbyá-guarani contam com uma complexa cosmologia, onde revelam que este tempo, espaço e matéria que se vive, é apenas uma cópia imperfeita e perene de um mundo perfeito. Nesse patamar perfeito do cosmos, estão assentadas as fundações do mundo por Nhanderú Pa-pa Tenonde (Nosso Pai último-último primeiro), que se desdobra em outros deuses, estes que se desdobram em suas devidas criações, proporcionando aos Mbyá-guarani desta Terra o conhecimento da origem de todos os elementos que constituem suas vidas. Aqui, proponho fazer como bem ensinam os Mbyá-guarani, guata (caminhar) em companhia do leitor pelas palavras contidas nos primeiros capítulos de Ayvu Rapyta e junto da teoria de parentesco, identificar os elementos que se configuram neste patamar mítico que dá sentido e continuidade às famílias extensas⁴ que caminham na Terra. Importante destacar esse caminhar, que é um dos principais elementos da cosmologia e da práxis Mbyá-guarani (aqui diferencio ambos conceitos não por estarem em oposição, mas pela possibilidade de encontrar nesta práxis esse manifestar mítico), muitas vezes observado de maneira desatenta como relacionado apenas a uma cosmologia falada/narrada. Entre os Mbyá-guarani essa narrativa acontece, ao passo que acontecem também o caminhar, o transformar-se, como condição de chegar-se um dia, quem sabe, a perfeição.
Cerâmica Wauja: arte e eficácia estética no Museu do Índio da UFU
Autoria: Mariana Elisa Gonçalves
Autoria: O estudo que originou este artigo foi realizado com o objetivo de compreender a prática ceramista milenar do grupo indígena denominado Wauja e relatar as experiências vividas em exposição etnográfica realizada no Museu do Índio da Universidade Federal de Uberlândia em 2019. Este artigo traz reflexões sobre a cosmologia Wauja e sua relação com a arte ceramista, a vida social e ritual deste grupo. Conduz a pensar também sobre a história do colecionamento de artefatos indígenas em museus e a potência agentiva desses objetos no contexto da promoção das práticas de ações educativas e mediações de público. Por fim, oferece argumentação sobre a importância da integração entre povos indígenas e museus etnográficos para o fortalecimento do protagonismo dos artistas indígenas nas instituições museais.